O uso da realidade aumentada com dispositivos móveis na educação matemática como potência na geometria espacial
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O USO DA REALIDADE AUMENTADA
COM DISPOSITIVOS MÓVEIS
NA EDUCAÇÃO MATEMÁTICA
COMO POTÊNCIA NA GEOMETRIA
ESPACIAL
LUIS OTONI MEIRELES RIBEIRO
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Sul-Rio-Grandense (IFSUL). Pós-doutor
em Educação na UFSC. Doutor em Informática na Educação na UFRGS. Mestre em Tecnologia
- Educação Tecnológica no CEFET-PR/UTFPR. Professor Titular do Mestrado em Educação e
Tecnologia – MPET. ORCID: 0000-0002-5526-8632 E-mail: luisribeiro@ifsul.edu.br
LISANDRA XAVIER GUTERRES
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Sul-Rio-Grandense (IFSUL). Bacharel em
Design Gráco na UFPEL. Mestranda em Educação e Tecnologia – MPET. ORCID: 0000-0001-
9432-8864 E-mail: l.xguterres@gmail.com
DENISE NASCIMENTO SILVEIRA
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Sul-Rio-Grandense (IFSUL). Pós-doutora
na Universidade do Porto. Doutora em Educação. Mestre em Educação. Graduação no Instituto
de Física e Matemática – IFM. Departamento de Matemática e Estatística – DME. Professora
titular do Mestrado em Educação e Tecnologia - MPET. ORCID: 0000-0001-9951-2302.
E-mail: silveiradenise13@gmail.com
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O USO DA REALIDADE AUMENTADA COM DISPOSITIVOS MÓVEIS NA EDUCAÇÃO
MATEMÁTICA COMO POTÊNCIA NA GEOMETRIA ESPACIAL
Este texto apresenta o uso da realidade aumentada em dispositivos móveis como um recurso educacional
potencial para o ensino de Geometria Espacial, pois essa tecnologia disruptiva permite que o aluno
se aproxime do objeto de aprendizagem, através da visualização interativa e imersiva de conceitos
abstratos da matemática. Visto que a realidade aumentada possibilita a manipulação de objetos virtuais
tridimensionais, os quais podem são visualizados sobrepostos ao ambiente físico, esse texto argumenta
como a ferramenta pode ser utilizada no ensino de Geometria Espacial, com o objetivo de promover
experiências signicativas aos alunos pela manipulação de sólidos geométricos em seus dispositivos
móveis..
Palavras-chave: Geometria Espacial. Realidade Aumentada. Tecnologias Educacionais.
EL USO DE LA REALIDAD AUMENTADA CON DISPOSITIVOS MÓVILES LA EDUCACIÓN
MATEMÁTICA COMO GEOMETRÍA ESPACIAL
Este texto presenta el uso de la realidad aumentada en dispositivos móviles como un recurso educativo
potencial para la enseñanza de la Geometría Espacial, ya que esta tecnología disruptiva permite al
estudiante acercarse al objeto de aprendizaje, a través de la visualización interactiva e inmersiva de
conceptos matemáticos abstractos. Dado que la realidad aumentada permite manipular objetos virtuales
tridimensionales, que se pueden ver superpuestos en el entorno físico, este texto argumenta cómo se puede
utilizar la herramienta en la enseñanza de la Geometría Espacial, con el n de promover experiencias
signicativas para los estudiantes mediante la manipulación sólidos geométricos en sus dispositivos
móviles.
Palabras clave: Geometría espacial. Realidad aumentada. Tecnologías educativas.
THE USE OF AUGMENTED REALITY WITH MOBILE DEVICES IN MATHEMATICS
EDUCATION AS A POWER IN SPATIAL GEOMETRYN
This text presents the use of augmented reality on mobile devices as a potential educational resource for the
teaching of Spatial Geometry, as this disruptive technology allows the student to get closer to the learning
object, through the interactive and immersive visualization of abstract concepts in mathematics. Since
augmented reality makes it possible to manipulate three-dimensional virtual objects, which can be viewed
superimposed on the physical environment, this text argues how the tool can be used in the teaching
of Spatial Geometry, with the aim of promoting meaningful experiences to students by manipulating
geometric solids on your mobile devices.
Keywords: Spatial Geometry. Augmented Reality. Educational Technologies.
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O USO DA REALIDADE AUMENTADA COM DISPOSITIVOS
MÓVEIS NA EDUCAÇÃO MATEMÁTICA COMO POTÊNCIA NA
GEOMETRIA ESPACIAL
Introdução
A evolução tecnológica possibilitou inúmeros avanços e facilidades às atividades realizadas
pela população, como o acesso à tecnologia, provinda da inserção dispositivos móveis que, pelas
suas características práticas e econômicas, tornaram-se recursos amplamente utilizados pelas pes-
soas, contribuindo na facilitação do desempenho de suas atividades cotidianas. No Brasil, conforme
dados da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo (ESTADO DE MINAS, 2019), em 2019 foi de-
tectado que para cada habitante existem dois dispositivos digitais, incluindo smartphones, tablets
e notebooks, dos quais se destacam o uso de smartphones, sendo 230 milhões de celulares ativos
no país, em contrapartida o número de notebooks, tablets e computadores são de 180 milhões. Os
dados revelam que os smartphones estão cada vez mais presentes e são o caminho mais próximo
entre a população e o acesso à tecnologia e a Internet.
Com base nesses dados, percebe-se que a amplitude do acesso aos dispositivos móveis,
permite que usuários estabeleçam conexão com os aplicativos criados para serem utilizados nesses
equipamentos. Existem inúmeros aplicativos destinados a diversas funções, como fazer compras
online, realizar videoconferências, controlar contas bancárias, entre outros usos, nos quais se
destaca a educação.
Um dos aspectos positivos do uso de aplicativos móveis na educação é a possibilidade
de inserir tecnologias como Realidade Aumentada e Realidade Virtual no contexto educacional.
Essas tecnologias, até então, estavam pouco difusas em função da complexidade dos sistemas, os
quais necessitavam de grandes aparatos tecnológicos para existir. Contudo, com a adequação para
o uso em aplicativos mobile, foram quebradas essas barreiras de acesso, permitindo à população
conhecer e utilizar a RV e RA em diferentes contextos.
Entre as nalidades de uso dos aplicativos de RA e RV, destaca-se a utilização na educação
de matemática, pois essas tecnologias disruptivas permitem a inserção de conteúdos educacionais
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em um contexto digital, no qual o aluno pode visualizar, de forma imersiva e interativa, conceitos
abstratos, permitindo uma aproximação do aluno com o objeto de aprendizagem.
A Realidade Aumentada se caracteriza, conforme Kirner e Kirner (2008) pela inserção de
objetos virtuais nos ambientes físicos que são apresentados aos usuários, em tempo real, com o
apoio de um dispositivo tecnológico (Figura 1) que utiliza como interface o ambiente real. Assim,
a inserção dos objetos virtuais no espaço físico pode ocorrer pela captura, com uso da câmera do
dispositivo, da imagem de um marcador que é processada na aplicação instalada e, posteriormente,
exibe um modelo tridimensional, vídeo ou imagem previamente associada ao marcador na tela do
dispositivo ou a partir da localização geográca do usuário, liberando informações conforme os
dados de localização.
Figura 1Aplicativo de Realidade Aumentada
Fonte: Blog da Arquitetura (2020)
1
1 Blog da Arquitetura. Disponível em: <https://www.blogdaarquitetura.com/augment-o-app-que-une-3d-e-realida-
de-aumentada/>. Acesso em: 31 mai. 2020.
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Já a Realidade Virtual permite a imersão de um usuário, em tempo real, em um ambiente
virtual tridimensional, ou seja, diferentemente da RA que potencializa o ambiente real, a RV su-
prime o espaço físico, utilizando apenas o ambiente sintético.
Com base nos aspectos dessas tecnologias este estudo tem como objetivo abordar o uso da
Realidade Aumentada no ensino de Geometria Espacial. Para isso, foram apontadas algumas das
principais possibilidades que podem ser contribuições signicativas do uso da RA no ensino de
sólidos geométricos.
Conforme Marques et al. (2018), existem diversos fatores que podem implicar nas dicul-
dades no ensino em matemática, como as metodologias adotadas pelos docentes, muitas vezes
consideradas desinteressantes ou até mesmo ultrapassadas pelos alunos. Por isso, torna-se im-
prescindível rever as estratégias de ensino e aprendizagem utilizadas com os discentes, de forma
a incluir atividades que engajem o estudante e facilitem sua compreensão.
A partir das diculdades percebidas no ensino de Geometria Espacial, foram abordadas
teoricamente nesta pesquisa as possíveis contribuições da Realidade Aumentada no ensino de
matemática.
O Ensino de Geometria Espacial
Segundo Eves (2004) a matemática primitiva surgiu no Oriente Antigo como uma ciência
prática para auxiliar as atividades ligadas à agricultura e à engenharia, pois essas atividades ne-
cessitavam da realização de cálculos para calendários utilizáveis, desenvolvimento de sistemas
de pesos e medidas nas colheitas, criação de métodos de agrimensura para a construção de canais
e reservatórios, entre outros aspectos. Com base nisso, desenvolveram-se tendências no sentido
da abstração e, de certa forma, iniciou-se o estudo da ciência em si.
Além das práticas relacionadas ao plantio e engenharia, acredita-se que o estudo da geo-
metria ocorreu no século XX a.C., nas civilizações egípcia e babilônica, em função da construção
monumentos como as pirâmides e outros, os quais não seriam possíveis de serem realizado sem
os devidos conhecimentos geométricos (EVES, 2004).
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Desde os primórdios da antiguidade a geometria está extremamente vinculada às atividades
cotidianas da população. Sendo assim, torna-se impossível dissociá-la da realidade, pois esses con-
ceitos abstratos, na verdade, fazem parte de tudo ao nosso redor, contudo, as práticas educacionais
no ensino de matemática que se utilizam apenas de conceitos abstratos, como uso de cálculos e
formas, acabam dicultando o entendimento, dos estudantes fazendo com que os alunos tenham
diculdades no aprendizado.
De acordo com o Ministério da Educação (MEC) (BRASIL, 1998, p.19), “o ensino de Ma-
temática ainda é marcado pelos altos índices de retenção, pela formalização precoce de conceitos,
pela excessiva preocupação com o treino de habilidades e mecanização de processos sem compre-
ensão.”. Esse aspecto da abordagem adotada no ensino, pode ser uma das razões do distanciamento
na relação entre matemática e realidade.
Por isso, se faz necessário o uso de discussões no âmbito da Educação Matemática que
adequem o sistema escolar de ensino a uma realidade na qual os conceitos desta disciplina devam
estar vinculados a diversos campos da atividade humana. E, nessa perspectiva, o campo da Edu-
cação Matemática vem se desenvolvendo como uma forte área do conhecimento que busca essas
aproximações, principalmente com o uso das tecnologias.
Desta forma, é perceptível que a realidade aumentada é uma estratégia que pode propiciar aos
alunos o estabelecimento de relações, através de meios digitais pela aproximação da matemática
com elementos do cotidiano, explorando todos os seus aspectos práticos, pois a RA permite que
o usuário manipule objetos virtuais tridimensionais e os introduzam em ambientes reais, gerando
experiências signicativas aos alunos.
Outro aspecto para se considerar é que existem algumas diculdades no ensino de geome-
tria que podem decorrer de fatores associados às fases do desenvolvimento da criança. Piaget e
Inhelder (1981, p. 167) realizaram um estudo no qual são analisados os mecanismos da construção
do espaço na criança. Conforme os autores as primeiras relações que a criança desenvolve estão
relacionadas as de ordem topológica, em que são denidas as noções de vizinhança, separação,
ordem, envolvimento, continuidade e grandezas. Contudo, ao contrário do espaço topológico,
o espaço projetivo e o espaço euclidiano consistem em situar os objetos com relação a outros,
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conforme suas projeções, perspectivas ou em “coordenadas”. Pelo fato de serem mais complexas,
essas estruturas são construídas mais tardiamente pela criança.
O espaço projetivo e o espaço euclidiano apoiam-se um no outro, pois a
construção dos sistemas naturais de coordenadas, que marcam o acabamento
das noções euclidianas fundamentais, nos parece sincronizar com a
coordenação geral dos pontos de vista característicos do espaço projetivo.
(PIAGET; INHELDER, 1981, p.438).
Com base na reexão dos aspectos estabelecidos pelos autores, percebe-se que existem
períodos propícios para o desenvolvimento de certas habilidades matemáticas na criança, que de
forma geral, ocorrem com pequenas variações de idades. Contudo, nesses períodos podem ocorrer
bloqueios e diculdades na compreensão e estimulação do desenvolvimento dessas habilidades,
resultando em experiências negativas que afetam a compreensão dessa ciência. Sendo assim, é
importante propiciar práticas em diferentes níveis que permitam o desenvolvimento da criança de
acordo com a fase que ela está vivenciando, mas sempre que possível relacionando com elementos
do cotidiano para que o indivíduo possa construir estruturas cognitivas com mais facilidade para
o novo conhecimento.
Os recursos digitais estão cada vez mais presentes nas famílias, inclusive com as crianças,
que utilizam dispositivos móveis para assistir desenhos, jogar, comunicar-se, entre outros aspectos.
Os smartphones, por exemplo, são um dos principais mecanismos para acessar o mundo digital.
Então, permitir que a criança aprenda através do uso de um dispositivo que lhe é familiar pode ser
uma estratégia ecaz. Contudo, a tecnologia por si não é suciente, é necessário utilizar esse
recurso com uma intencionalidade pedagógica.
É nesse ponto que a realidade aumentada e o ensino de geometria podem se aliar para
estabelecer uma experiência de aprendizagem mais signicativa ao alunos, pois permitir que os
alunos manipulem objetos virtuais em conjunto com o ambiente real “pode ser concebido como
uma transformação do campo perceptivo e todo campo perceptivo como um conjunto de relações
determinadas por movimentos.” (PIAGET; INHELDER, 1981, p.29).
O movimento com o objeto virtual, mesmo que não seja tátil, propriamente dito, existe
enquanto manipulação do dispositivo móvel e do marcador do objeto virtual, manifestando uma
resposta imediata às ações do usuário que podem ser visualizadas no display do dispositivo. Per-
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ceber como as formas se comportam é um elemento fundamental para a aprendizagem de geome-
tria espacial, anal, ver o porquê e como ocorrem os cálculos com base nas experiências reais e
conhecidas (subsunçores) podem tornar a aprendizagem mais signicativa (AUSUBEL, 2003).
Dessa forma, infere-se que muitas das diculdades na compreensão da geometria espacial
são consequências da abordagem de forma inadequada de seu ensino. E, a realidade aumentada
mostra-se como um caminho promissor para o processo de ensino e aprendizagem. Piaget e Garcia
(2011) escrevem que quando as relações são compreendidas, elas obedecem às leis de compensa-
ções, pois as partes do objeto que se tornam invisíveis, em caso de rotação, são substituídas por
partes até então invisíveis que se tornam visíveis; condições que pode ser oferecida pela realidade
aumentada.
A Realidade Aumentada
O Termo “Realidade Aumentada” surgiu em 1990, quando o Prof. Thomas Caudell designou
como Realidade Aumentada um projeto que estava desenvolvendo de um mostrador digital para
aviões, que mesclava grácos virtuais em uma realidade física, em colaboração com a empresa
Boing.
Segundo Azuma (1997) a RA é uma tecnologia que combina os conteúdos reais e virtuais,
que interagem concomitantemente e em tempo real, acrescentando elementos a realidade, em vez
de substituí-la completamente. Em seu artigo A Survey of Augmented Reality” o autor destaca
três características fundamentais para classicar um sistema de RA:
a) Combinar conteúdo virtual e real;
b) O sistema deve ser interativo e a interação deve ocorrer em tempo real;
c) Alinhar elementos reais e virtuais em três dimensões.
No contexto atual, existem duas formas mais usuais de acionar os sistemas de realidade
aumentada em aplicativos para dispositivos móveis, a primeira através do uso de marcadores,
imagens bidimensionais que quando reconhecidas pelo uso da câmera do dispositivo em conjunto
com a aplicação instalada nesse, exibem na tela modelos em realidade aumentada. A segunda se
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caracteriza pelo uso do posicionamento GPS para mapear a posição espacial do usuário e, assim,
disponibilizar conteúdos dirigidos para aquela localização.
A crescente popularização da realidade aumentada pode ser atribuída ao surgimento do jogo
Pokémon Go (Figura 2), desenvolvido em 2016 pela Niantic, que propiciou uma rápida disseminação
mundial da RA. O Pokémon Go mostrou que é possível unir o real e o virtual, pois sua jogabilidade
consiste em estimular as pessoas a saírem de casa para buscar novos desaos. Os usuários devem
se dirigirem a pontos estratégicos para realizar a coleta de itens, tais como: pontos turísticos,
museus, praças, monumentos, entre outros, incentivando a valorização da cultura de cada região.
Figura 2 - Pokémon Go
Fonte: Pokémon Go Live (2020)
2
Atualmente, existem softwares que permitem o desenvolvimento de aplicações de realidade
aumentada e virtual de forma gratuita, como o Blender e Unity, ou com versões gratuitas para
estudantes, como o 3DS Max Studio.
O Blender e o 3DS Max são programas de modelagem tridimensional que permitem modelar,
mapear, texturizar, animar, iluminar e renderizar maquetes virtuais. Esses softwares trabalham em
consonância com o Unity, um motor de jogo, desenvolvido pela Unity Technologies em 2005, que
permite a importação de modelos tridimensionais de softwares como 3Ds Max, Blender, entre
2 Pokémon Go Live. Disponível em: <https://pokemongolive.com/pt_br/post/arplus/>. Acesso em: 31 mai. 2020.
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outros. Os modelos tridimensionais podem serem transformados em aplicações de RA ou RV para
dispositivos móveis com o uso da Unity em conjunto com kits de desenvolvimento.
Existem diversas formas de desenvolver aplicações de RV e RA no Unity, por exemplo,
a empresa Google disponibiliza o código aberto para criar experiências imersivas de realidade
virtual para plataformas Android e iOS, através do uso do Google Cardboard (Figura 3) óculos de
realidade virtual feito de papelão para realidade virtual que também tem seu molde disponibilidade
pela Google. A Google também oferece o ARCore, um kit de desenvolvimento gratuito para gerar
aplicações de realidade aumentada. Contudo, as aplicações desenvolvidas com uso do ARCore
podem ser utilizadas apenas em dispositivos móveis mais atuais com Android 7.0 ou superior.
Figura 3Google Cardboard
Fonte: ARVR Google (2020)
3
O Vuforia é um dos mais populares kits de desenvolvimento para aplicações de realidade
aumentada. Entretanto, possui apenas uma versão gratuita para desenvolvedor, ou seja, não é pos-
sível a distribuição dos aplicativos gerados a partir dele, para isso é necessário adquirir uma chave
3 ARVR Google. Disponível em: <https://arvr.google.com/cardboard/>. Acesso em: 28 jun. 2020.
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de licença paga. Contudo, devido a sua facilidade de uso e por permitir o desenvolvimento de uma
aplicação de RA para dispositivos com Android inferior ao 7.0, que quando instaladas diretamente
no dispositivo, ou seja, não distribuídas em lojas virtuais ou comercialmente, podem ser utilizadas
gratuitamente. Tal facilidade permite, assim, que professores e alunos obtenham uma experiência
de geração de aplicativos de RA de maneira fácil e acessível.
Realidade Aumentada e Ensino de Geometria Espacial
Além da possibilidade dos próprios educadores e alunos desenvolverem softwares de RA,
como os recursos vistos no capítulo anterior, existem aplicativos criados e distribuídos gratuitamente
para o ensino de geometria espacial que utilizam realidade aumentada. Dentre eles, destacamos:
GeometriAR
O GeometriAR (Figura 4) é um aplicativo para o ensino de geometria espacial no qual é
possível visualizar sólidos, como prismas, pirâmides, cilindros, cones, entre outros, em realidade
aumentada a partir da captura de imagens pela câmera do dispositivo.
Figura 4GeometriAR
Fonte: Elaborado pelos autores com base na captura da tela do aplicativo GeometriAR
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Além disso, o aplicativo exibe animações com simulações da planicação dos objetos (Figura
5) e, também, fórmulas matemáticas relacionadas a cada sólido.
Figura 5 – Planicação de um cubo no GeometriAR
Fonte: Elaborado pelos autores com base na captura da tela do aplicativo GeometriAR
O aplicativo pode ser um importante aliado no ensino de geometria espacial, pois possibilita
aos alunos explorar tridimensionalmente sólidos, além de permitir a planicação e o acesso às
fórmulas correspondentes. Por m, o GeometriAR propõe um desao, com uma série de questões
referentes aos sólidos geométricos. O aplicativo possui duas versões, uma gratuita e uma Pro. A
versão Pro se distingue da gratuita por não apresentar anúncios e disponibilizar mais sólidos para
análise.
Polyèdres augmentès
Assim como o GeometriAR, o Polyèdres augmentès (Figura 6) é um aplicativo que permite
visualizar sólidos geométricos tridimensionais através da captura da imagem pela câmera dos
dispositivos.
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Figura 6 – Visualização de sólidos geométricos no Polyèdres augmentès
Fonte: Polyèdres augmentès (2020)
4
Nesse aplicativo é possível visualizar mais de um objeto simultaneamente na tela, por meio
da captura da imagem de dois marcadores ou mais.
Geometrix
O Geometrix (Figura 7) é um aplicativo para visualização de sólidos geométricos que assim
como os exemplos acima utiliza realidade aumentada e marcadores para disponibilizar o conteúdo.
Além de permitir a visualização de modelos tridimensionais de poliedros regulares, pirâmides, pris-
mas e sólidos de revolução em realidade aumentada, o aplicativo fornece informações sobre esses
sólidos, tais como: número de faces, vértices, arestas, fórmula para calcular o volume e área externa.
4 Polyèdres augmentès. Disponível em: <https://play.google.com/store/apps/details?id=com.miragestudio.
polygons&hl=pt_BR>. Acesso em: 31 mai. 2020.
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Figura 7 – Visualização de sólidos geométricos no Geometrix
Fonte: Geometrix (2020)
5
As informações de faces, arestas e vértices podem ser acionadas ou omitidas, conforme as
necessidades do usuário no menu direito do aplicativo. O usuário também pode habilitar ou desa-
bilitar a opção de girar o sólido automaticamente, assim como aumentar ou diminuir o tamanho da
gura, nos botões com o símbolo de mais e menos. No botão com a letra “i” são disponibilizadas
mais informações, como a descrição da gura geométrica. No botão com o símbolo da raiz qua-
drada o usuário acessa as fórmulas, como volume e área do sólido em questão. Por m, na opção
congurações é possível selecionar a câmera frontal ou traseira, bem como a sua resolução.
Com base nos aplicativos apresentados acima foi possível perceber que existem uma série
de funcionalidades disponibilizadas para auxiliar os alunos a compreender a geometria espacial
através do uso de tecnologias móveis e realidade aumentada. Contudo, só a tecnologia não é o
suciente, pois sempre é necessário que o professor utilize os recursos com uma intencionalida-
de pedagógica especíca, ou seja, propor práticas que possam unir a tecnologia aos conteúdos e
atividades em sala de aula.
5 Geometrix. Disponível em: <https://play.google.com/store/apps/details?id=com.tcc.geometrix>. Acesso em: 31 mai.
2020.
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A realidade aumentada permite ver os objetos virtuais simultaneamente a ambientes reais,
possibilitando que o professor possa construir com os alunos a reexão sobre soluções a problemas
cotidianos, como a inclinação de uma rampa de acesso a entrada de uma escola, entre outros aspectos.
Conforme Ausubel (2003) o processo de aprendizagem signicativa ocorre quando uma
nova informação, apresentada de forma simbólica, estabelece um processo de ancoragem com
os conhecimentos prévios do aprendiz (subsunçores), surgindo, com isso, um novo signicado.
Com base nisso, percebe-se que a Geometria Espacial pode utilizar da RA para exemplicar ações
através do uso de recursos familiares aos indivíduos, como embalagens, monumentos, elementos
do cotidiano, como a rampa de acesso descrita acima, além de outros objetos que podem ser cons-
truídos tridimensionalmente e transportados para a sala de aula, auxiliando no ensino de geometria
espacial, através do uso da RA.
Também é importante ressaltar que pelo fato de ainda existir barreiras de acesso à tecnologia
nas escolas, com a disseminação dos dispositivos móveis, os alunos podem utilizar os seus apa-
relhos para realizar as atividades. As barreiras podem ser devido à escassez e inacessibilidade aos
laboratórios de informática que, por vezes, estão desativados em função de falta de manutenção,
impossibilitando, assim, os alunos de experimentar recursos tecnológicos para a aprendizagem.
A adoção dessa prática se originou com a expressão Bring your own device (BYOD) ou traga
o seu próprio dispositivo (tradução nossa) utilizado inicialmente pelos funcionários da empresa Intel
(2009), que se refere ao ato de usar o seu próprio dispositivo móvel para acessar as informações.
No contexto acadêmico, permitir que os alunos utilizem os seus dispositivos é uma estratégia que
além de viabilizar o uso da tecnologia em sala de aula, promove a adoção de uma postura mais
ativa dos estudantes, que visualizam e compartilham as suas experiências entre si, agindo sobre
os objetos virtuais, o que permite uma experiência de “tangibilidade” (DE ALMEIDA; LIMA;
BORGES, 2019).
Considerando que a matemática é uma ciência que possui muitos conceitos abstratos, essa
característica tangível da realidade aumentada pode ser uma excelente estratégia para auxiliar na
compreensão do conteúdo pelos alunos, pois conforme Piaget e Garcia (2011) o conhecimento não
precede nem do sujeito consciente de si mesmo, nem dos objetos os quais se apropria. Essa ação
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de construção do conhecimento é resultante das interações do sujeito com o meio, na proporção
em que ele se apropria dos mecanismos internos de suas ações (BECKER, 1998).
Ainda, o autor ressalta a importância que a relação de movimento exerce, desde as fases
primárias até o amadurecimento das relações entre objeto e espaço, “todo o movimento pode ser
concebido como uma transformação do campo perceptivo e todo campo perceptivo como um
conjunto de relações determinadas por movimentos.” (PIAGET; INHELDER, 1981, p.29). Sendo
assim, vemos uma contribuição signicativa na utilização de realidade aumentada no ensino de
matemática, pois a tecnologia permite estabelecer uma relação de movimento com o objeto virtu-
al, mesmo que não seja tátil, propriamente dita, mas existente enquanto manipulação do modelo
virtual em conjunto com o dispositivo móvel e o marcador, gerando respostas em tempo real as
ações de rotação, aproximação e afastamento (escala) ou posição sobre o objeto virtual realizadas
pelo usuário.
Por m, permitir que os alunos experimentem essas tecnologias na educação possibilita
que eles desenvolvam habilidades tecnológicas que são cada vez mais exigidas no contexto pro-
ssional, sendo assim, mediar o processo entre a educação e o uso da tecnologia é uma forma de
preparar os estudantes para os desaos futuros. Tendo em vista o potencial das tecnologias de RA
e RV, em que ambas possibilitam aos próprios estudantes ou professores desenvolverem modelos
e compartilhá-los com a comunidade acadêmica, percebe-se que a RA e RV podem ser importantes
recursos para a integração dos alunos com o meio digital.
Considerações nais
A revisão dos diversos aplicativos de Realidade Aumentada aqui exemplicados e a expli-
cação de suas potencialidades pode trazer luz a docentes interessados em compreender a educação
matemática num cenário de tecnologias digitais de informação e comunicação.
Em especial, o ensino da Geometria Espacial pode ser beneciado com a adoção de apli-
cativos em dispositivos móveis que exploram a realidade aumentada na visualização espacial. O
uso de dispositivos móveis como tablets e smartphones desloca o protagonismo da manipulação
dos objetos de aprendizagem espaciais para as mãos do estudante, pois este passa a utilizar o seu
próprio dispositivo (BYOD).
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Os constructos internos de cada estudante passam a ser afetados pela manipulação em tempo
real do objeto espacial, não só observado, mas manipulado pelas mãos e cérebros ativos do sujeito
aprendente. O docente antes direcionado e implicado a usar de estratégias puramente expositivas,
no controle de mídias unidirecionais de apresentação, como projetores multimídia e retroprojetores,
integra ao seu repertório didático-pedagógico de uma ferramenta cognitiva (JONASSEN, 2007). O
que torna possível a construção de contextos de aprendizagem em maior sintonia com a realidade
tecnológica atual de nossos estudantes.
Além disso, permitir que os alunos experimentem essas tecnologias na educação possibilita
que eles desenvolvam habilidades tecnológicas que são cada vez mais exigidas no contexto pro-
ssional, sendo assim mediar o processo entre a educação e o uso da tecnologia é uma forma de
preparar os estudantes para os desaos futuros.
REFERÊNCIAS
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Recebido em: 19 de junho de 2020.
Inserido em: 10 de agosto de 2020.
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