MEMÓRIAS (AUTO)BIOGRÁFICAS DE UMA ENFERMEIRA NO EXERCÍCIO DOCENTE: PERCURSO PESSOAL E PROFISSIONAL

 

BIOGRAPHICAL (AUTO) MEMORIES OF A NURSE IN THE TEACHING EXERCISE: PERSONAL AND PROFESSIONAL PATH

 

MEMORIAS (AUTO) BIOGRÁFICAS DE UNA ENFERMERA EN EL EJERCICIO DOCENTE: TRAYECTORIA PERSONAL Y PROFESIONAL

 

Rita Amorim¹

 

¹Universidade Estadual de Feira de Santana

 

Email: ana.viana@ifsertao-pe.edu.br

Recebido: 06.10.2023 Aceito: 25.12.2023

 

 

 

RESUMO: Esse memorial teve como objetivo rememorar o meu percurso pessoal e profissional ao longo da minha existência a partir das diversas interações com familiares, amigos, amigas, alunos, alunas, professoras, professores, resultando na mulher profissional que sou, descobrindo e sendo descoberta, com os amores e as dores que fazem pulsar a vida, em atenção a uma das etapas do processo de progressão de carreira para professora titular do Magistério Superior da Universidade Estadual de Feira de Santana-UEFS. Possui caráter descritivo. No processo de elaboração me encontrei com as memórias de minhas experiências pessoais e profissionais. Num momento, como filha, neta, sobrinha, irmã, prima, amiga, colega e noutro como aluna, enfermeira e professora, pois fiz a escolha de escrita (auto) biográfica. Assim, apresento algumas das diversas possibilidades de interações ao longo do meu percurso de vida, notadamente familiar e profissional. Narro acerca dos meus anos de estudos institucionalizados, da alfabetização à pós-graduação, atuação como enfermeira numa instituição pública de saúde e noutra instituição pública de ensino superior e as demais atuações no campo profissional. Por fim, apresento as minhas inquietações para o futuro.

 

Palavras-chave: Memorial; Professora Titular; Progressão de Carreira; Universidade.

 

 

ABSTRACT: This memorial aimed to recall my personal and professional journey throughout my existence from the various interactions with family, friends, friends, students, students, teachers, teachers, resulting in the professional woman I am, discovering and being discovered, with the loves and pains that make life pulsate, in attention to one of the stages of the career progression process for full professor of the Higher Teaching of the State University of Feira de Santana-UEFS. It has descriptive character. In the process of elaboration I met with the memories of my personal and professional experiences. One moment, as a daughter, granddaughter, niece, sister, cousin, friend, colleague and another as a student, nurse and teacher, because I made the choice of writing (auto) biographical. Thus, I present some of the various possibilities of interactions throughout my life path, notably family and professional. I narrate about my years of institutionalized studies, from literacy to postgraduate studies, working as a nurse in a public health institution and in another public institution of higher education and other activities in the professional field. Finally, I present my concerns for the future.

 

 

Keywords: Memorial; Full Professor; Career Progression; University.

 

 

RESUMEN: Ese memorial tuvo como objetivo rememorar mi trayectoria personal y profesional a lo largo de mi existencia a partir de las diversas interacciones con familiares, amigos, amigas, alumnos, alumnas, profesoras, profesores, resultando en la mujer profesional que soy, descubriendo y siendo descubierta, con los amores y los dolores que hacen palpitar la vida, en atención a una de las etapas del proceso de progresión de carrera para profesora titular del Magisterio Superior de la Universidad Estadual de Feira de Santana-UEFS. Posee carácter descriptivo. En el proceso de elaboración me encontré con las memorias de mis experiencias personales y profesionales. En un momento, como hija, nieta, sobrina, hermana, prima, amiga, colega y en otro como alumna, enfermera y profesora, pues hice la elección de escritura (auto) biográfica. Así, presento algunas de las diversas posibilidades de interacciones a lo largo de mi recorrido de vida, especialmente familiar y profesional. Narro acerca de mis años de estudios institucionalizados, desde la alfabetización hasta el posgrado, actuando como enfermera en una institución pública de salud y en otra institución pública de enseñanza superior y las demás actuaciones en el campo profesional. Por último, presento mis inquietudes para el futuro.

 

 

Palabras Clave: Memorial; Profesora Titular; Progresión de Carrera; Universidad.

 

CONSTITUINTES (AUTO)BIOGRÁFICOS

 

“Você sabia que a minha tia tem três casas? Essa aqui, uma na roça e uma no condomínio” (Daniel, 5 anos, meu sobrinho).

 

 De acordo com Rabinovich (2013, p.21) “[...] a autobiografia tem sido apontada como um caminho metodológico para explorar a condição humana [...]”, concordo com a autora, pois ao rememorar as minhas experiências, as sensações emergentes inundaram o meu ser no que tange a minha ancestralidade e a mim mesma remodelando o meu self, corroborando com a autora supracitada quando afirma que,

 

“[...] pela narrativa autobiográfica, um novo self é moldado: dimensões do ser são reveladas que literalmente não teriam existido, não teriam alcançado uma forma articulada, se o projeto de uma compreensão autobiográfica não tivesse ocorrido. A vida recontada toma uma perspectiva inacessível à percepção comum e marca uma extrapolação poética que remodela nossas relações com relação ao mundo [...]” (RABINOVICH, 2013, p.21).

 

 Assim, afirmo que para a descrição desse memorial, num primeiro momento, rememoro as minhas experiências e fiz leituras de diversos materiais acerca do memorial e, num segundo momento, conversei com pessoas na busca de validar algumas informações que a minha memória parecia não dar conta como evidência necessária para a escrita. Foram ricos momentos permeados, na sua imensa parte, pelo contentamento e a gratidão pelas conquistas.

Neste Memorial, busco rememorar o meu percurso pessoal e profissional ao longo da minha existência, a partir das diversas interações com familiares, amigos, amigas, alunos, alunas, professoras, professores, resultando na mulher profissional que sou; descobrindo e sendo descoberta com os amores e as dores que fazem pulsar a vida com a finalidade de atender a uma das etapas do processo de progressão de carreira para professora titular do Magistério Superior da Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS).

Na busca pela qualificação profissional no campo da pesquisa para ampliar a prática, notadamente no que tange ao objeto família, iniciei o meu doutoramento em 2012 no Programa de Pós Graduação em Família na Sociedade Contemporânea da Universidade Católica do Salvador (UCSal) e, nesse mesmo ano, passei a integrar o grupo de pesquisa Família, (Auto) Biografia e Poética (FABEP) e eis que se apresentou a oportunidade de estudar a família de dentro (a nossa família) e, então, me deparei com ricas descobertas sobre mim e a minha própria família e não somente acerca da família do outro – como pensei antes, conforme discorrerei ao longo desses escritos que se seguem.

No FABEP fui interrogada acerca de quando me senti pertencente a minha família, sobre a casa e sobre a família extensa, dito de outro modo, sobre a minha ancestralidade. Assim, nesses escritos, escolhi escrever as memórias de meu percurso pessoal e profissional por meio das casas ou das nossas casas, pois a partir das casas e, como mulher preta, estou juntando os “cacos” dos meus antepassados que constituem o meu alicerce. Conforme mencionou Daniel, na epígrafe, gosto de possuir muitas casas, afinal, elas possuem e contam as memórias, muitas vezes alegres e felizes, noutras nem tanto.

Já morei em diversas casas, conforme vocês virão ao longo desses escritos. Foi na casa de meu pai e de minha mãe que possuí a minha experiência originária de casa, juntamente com a minha família de origem e tive a minha primeira escola de amor, cuidado, ética, conflitos, silêncios, respeito e responsabilidade, o que vem ao encontro de Bolsanello (2017, p.319) quando diz que: “[...] a família educa para a vida [...], na família, em geral vivemos as primeiras e diversas experiências de convivência permeadas por amor, cuidado, conflitos e tantos outros experimentos de aprendizagem e ensinamentos”.

A minha origem é rural, nasci na fazenda Tapera, na cidade de Conceição da Feira, Bahia. Escolhi iniciar o meu percurso pessoal pela casa dos meus avós paternos. Por que comecei por essa casa?  Porque essa casa possui cacos de uma das partes de minha história – meus antepassados paternos. Nessa casa, minha mãe e meu pai iniciaram a nossa família nuclear. Possuo poucas lembranças dela, pois frequentei na minha tenra idade; não conheci meus avós, pois, ela (minha avó) faleceu quando meu pai e um dos seus irmãos eram crianças e ele (meu avô) faleceu quando meu pai e os irmãos eram adultos. A minha avó, madrasta do meu pai, mulher do segundo casamento de meu avô, morou conosco (minha família nuclear) até a sua morte.

Meu tio morava nessa casa com a sua família, fui diversas vezes visitá-los. Quando ele se mudou para a cidade, a casa dos meus avós paternos ficou fechada e, posteriormente, foi ocupada por uma parenta distante que estava sem casa, como acontece nas famílias de classe popular, de acordo com Fonseca (2005), a família acontece em rede e, no meu caso, a riqueza dessa rede se deu pela permanência da casa.

Em 1966 cheguei ao mundo na casa construída por meu pai e minha mãe. “Já cheguei ao mundo na minha casa, pois nasci em casa [...].” (AMORIM, 2016 p. 275). Aqui vivemos juntamente com meu pai, a minha mãe, os meus irmãos e a minha avó paterna e uma rede de parentes e vizinhos (as). Sempre volto à essa localidade em finais de semana, feriados e nas férias.

Nessa casa da roça vivia livre, envolvida em brincadeiras com meus irmãos e as crianças da vizinhança. Nos dias ensolarados de verão amava olhar o céu azul com as nuvens separadas para imaginar e visualizar figuras, as mais diversas. Já nos dias de chuva, em que formavam diversas poças d’água no quintal (terreiro), eu e os meus irmãos aproveitávamos para tomar banho de chuva, pular, seguido de reclamação de nossa mãe com receio de ficarmos doentes.  Pertencer a minha família me constituiu “[...] uma pessoa singular com crenças, valores, respeito, responsabilidades, medo... e contribui para a minha socialização no mundo o tempo todo.” (AMORIM, 2016, p.281).

Em 1983, por motivo de estudo, iniciei a minha transição do campo para a cidade, e passei a morar de segunda a sexta-feira na casa de meus tios, voltando para a casa de meus pais somente nos finais de semana, feriados e férias. Com o término do ensino médio, ingressei na Universidade e posteriormente no mundo do trabalho.

Na primeira década do século 21, em 2001, fui morar em São Paulo para cursar o mestrado na Universidade Federal de São Paulo - UNIFESP/EPM. Nova casa na minha vida. Essa casa/apartamento é marcada pela primeira vez que morei numa metrópole com amigas, inicialmente, éramos duas, depois quatro e por fim três. Aprendemos e ensinamos umas com as outras. Essa experiência rendeu uma amizade para a vida.

Em 2012, por motivo do doutoramento, mudei para a capital baiana com a pretensão de morar sozinha, mas no segundo semestre tive a companhia durante a semana de uma colega do curso, de outra cidade, que precisava de acolhimento na capital, nos dias de aula e outras atividades. Em seguida, tive a grata alegria de ter a minha afilhada-filha que ingressou no curso de Direito da Universidade Federal da Bahia (UFBA) morando comigo e em seguida, veio integrar-se a nós, outra sobrinha. Tempos de uma riqueza singular.

No processo de doutoramento mudei para Lisboa. Essa casa/apartamento foi marcada pela segunda experiência de morar com amigas, dessa vez, éramos três. Novamente, tempos recheados de aprendizagens e ensinamentos. Semelhante a experiência de morada anterior, rendeu uma amizade para a vida.

Atualmente resido em minha casa em Feira de Santana, Bahia, casa essa marcada por memórias afetivas de familiares, por meio da presença de objeto e plantas, viagens e pela presença de familiares, amigos, amigas. Na minha casa, me reconheço na fotografia passada ou no espelho de agora, respondendo a Oswaldo Montenegro que pergunta na música A lista (2001): “[...] onde você ainda se reconhece, na foto passada ou no espelho de agora [...]”. A minha casa é aberta para quem é de paz. “Se for de paz, pode entrar”, informa o tapete de entrada. Reflito que essa é a minha casa de agora, pois ainda pretendo seguir experienciando casas. O tempo dirá.

Voltando à minha infância, aos seis anos ingressei na Escola Rural da Jaqueira, numa casa cedida por um fazendeiro à prefeitura municipal de Conceição da Feira, minha cidade natal. Lá funcionava uma escola multisseriada com apenas uma sala de aula, a sala da casa. Lembro-me da menina tímida e magrela, em meio a uma turma de alunas (os) de diversas idades e das mais variadas séries, éramos estudantes, do 1º ao 6º ano.

 Ficaram na minha memória as (os) minhas (meus) colegas mais velhas (os), certamente porque cuidavam de mim e também a inesquecível professora Auristela que conseguia ensinar e cuidar de todas (os), ou pelo menos tentava.  A escola da Jaqueira na atualidade é ocupada pelos familiares dos antigos proprietários.

Fui alfabetizada na escola da jaqueira e posteriormente, transferida para outra escola rural, denominada Escola Municipal do Murici, também multisseriada. Na atualidade, a prefeitura construiu um complexo escolar na zona rural que atende a diversos povoados e doou o antigo prédio da escola do povoado de Murici a igreja católica da comunidade. No quarto ano do ensino primário (Fundamental I) fui transferida para o Colégio Hermilo Cardoso, situado na zona urbana. Portanto, a minha formação inicial aconteceu em escolas do campo e da cidade.

O atual ensino Fundamental II, cursei numa escola da rede privada na cidade de Conceição da Feira, Colégio Educacional de Conceição da Feira e o Ensino Médio no Colégio Estadual de Feira de Santana.

 

A UNIVERSIDADE: SOBRE A FORMAÇÃO NO ÂMBITO DA GRADUAÇÃO – O CURSO DE ENFERMAGEM

 

Período que culminou com a escolha de uma profissão, demarcando, portanto, o início de uma carreira profissional permeada por alegria - por ter passado no vestibular de uma universidade pública - e por dúvidas, medo, expectativa... era 1986, começo da redemocratização do Brasil. A instituição? Universidade Estadual de Feira de Santana (UEFS), o curso de Enfermagem.

É, possuí o privilégio de estudar na universidade em tempos promissores, regado pela democracia, pelo direito e o dever do pensar. Cursei Enfermagem vivenciando as mudanças no sistema de saúde brasileiro. Iniciei o curso estudando o Sistema Único Descentralizado de Saúde – SUDS que se transformou no Sistema Único de Saúde – SUS que possui como princípios a universalidade, a integralidade, a equidade, a descentralização, a regionalização, a hierarquização e a participação popular.

Naquela época, o curso de Enfermagem era estruturado em um ciclo básico nos dois primeiros anos e os dois últimos anos, o ciclo profissionalizante. No primeiro ciclo, estudávamos anatomia, fisiologia humana, bioquímica, sociologia, dentre outros componentes curriculares do campo biológico e social. No segundo ciclo, iniciávamos o ciclo profissionalizante com o estudo dos componentes curriculares específicos de Enfermagem, a exemplo de introdução à enfermagem, saúde pública, enfermagem psiquiátrica, enfermagem médico-cirúrgica, desenvolvendo estágios nas unidades de saúde e instituições hospitalares.

Dois componentes curriculares ofertados no quinto semestre marcaram o meu processo de formação: Introdução à Enfermagem e Enfermagem Psiquiátrica, no primeiro, aprendíamos sobre metodologia da assistência em Enfermagem por meio das Teorias de Enfermagem e do processo de Enfermagem e as técnicas de Enfermagem. Fiquei fascinada pelas técnicas, porém, decidi que seria enfermeira, ao cursar Enfermagem Psiquiátrica, pois aprendi a importância de cuidar da pessoa, respeitando a sua história de vida e entendendo não somente que a pessoa adoecida necessita de cuidado, mas os seus familiares também.

No sétimo semestre, fiz seleção para bolsista no hospital Dom Pedro de Alcântara (HDPA), conveniado a UEFS, sendo aprovada. Atuei como bolsista, por um ano, desenvolvendo atividades de cuidado nas clínicas médica, cirúrgica, pediatria e materno-infantil. Esse período foi relevante para a minha formação, pois pude fazer uma imersão no cuidado de enfermagem à pessoa hospitalizada, consequentemente, nas técnicas de enfermagem e também pude praticar o cuidado aos familiares acompanhantes dessas pessoas.

O fascínio por técnicas seguiu comigo, tanto como enfermeira, como professora, buscando cada detalhe da técnica, de acordo com o princípio técnico-científico da mesma. No início da minha carreira, no que tange as técnicas fui ao encontro do que disse Alves (2001, p.50-51) acerca de jovens professoras (es) ao escrever uma carta para um jovem professor “[...] os professores jovens são terríveis; eles ainda não se desembaraçaram do cipoal de teorias aprendidas na universidade, têm sempre muita coisa a provar, e acreditam demais no que pensam saber [...]”.

Outra experiência relevante que tive no curso de Enfermagem foi a elaboração do trabalho de conclusão de curso (TCC), cujo objeto nasceu das minhas inquietações quando realizei o estágio, no oitavo semestre no componente curricular Saúde Pública Rural, a minha primeira atuação como estudante de Enfermagem na área rural. Lá, em contato com a comunidade percebi a semelhança com a minha comunidade originária, pois as pessoas também utilizavam as plantas para cuidar da saúde, por meio de chás, cataplasmas e outros. Então, resolvi investigar o uso das plantas, juntamente com uma colega de curso, tendo como orientadora a professora doutora Maria Ângela Alves do Nascimento.

 

FORMAÇÃO NO ÂMBITO DA PÓS-GRADUAÇÃO

 

Iniciei a minha pós-graduação Lato Sensu em 2000, quando ingressei no Curso de Especialização em Metodologia da Assistência em Enfermagem, na Universidade do Estado da Bahia (UNEB), pois desejava aprofundar meus estudos sobre os fundamentos teóricos e metodológicos da assistência em Enfermagem, qualificando a minha prática docente e de enfermeira assistencial, o meu objeto de estudo de trabalho de conclusão de curso (TCC) foi o ensino do cuidado no Curso de Enfermagem da UEFS.

O título do meu TCC é O cuidar/cuidado: representações dos alunos de Fundamentos de Enfermagem, tendo como orientadora a professora Doutora Delvair de Brito Alves. Concluí a especialização em 2001 e ainda mais inquieta com os resultados da pesquisa com relação ao ensinar e o fazer da enfermeira, pois o estudo apontou representações do cuidado como um ato mecânico, decidi prestar seleção para mestrado e aprofundar a pesquisa.

Ainda no âmbito da pós-graduação Lato Sensu buscando qualificar o ensino e o cuidado à pessoa idosa, em 2021 ingressei no curso de pós-graduação em Gerontologia na Universidade Católica do Salvador – UCSal, no qual apresentei como trabalho de conclusão de curso, um projeto de intervenção, intitulado “Capacitação para o autocuidado do cuidador familiar de idoso com dependência: uma proposta de intervenção”, orientado pela professora Mestra Amélia Maria Pithon Borges Nunes.

Em março de 2001 ingressei na pós-graduação Stricto Sensu no Mestrado em Ciências da Universidade Federal de São Paulo - UNIFESP. Durante o mestrado intensifiquei meu estudo nas áreas de conhecimento de Pedagogia, Sociologia e Antropologia, assim como estreitei laços com algumas professoras, o que contribuiu para ampliar o meu olhar sobre as questões de gênero, saúde e educação, tanto na atuação hospitalar, como na formação das futuras enfermeiras. O meu objeto de estudo da dissertação foi o ensino do cuidado na área de saúde do adulto, tendo como participantes docentes da referida área de conhecimento, discentes do último semestre do curso de enfermagem da UEFS e enfermeiras egressas desse curso.

No segundo ano do mestrado atuei como monitora na turma de mestrado em enfermagem da instituição onde cursava o mestrado, no componente curricular Fundamentos Teóricos e Metodológicos da Educação, aprofundando temas relacionados à Educação, o que foi de grande valia para a minha formação. Tive como professora responsável, a Doutora Maria Célia De Santi.  Defendi a dissertação de mestrado intitulada O ensino e práticas de cuidado em enfermagem tendo como orientadora a professora Doutora Eleonora Menicucci de Oliveira.

 Em 2012, conforme mencionei inicialmente, ingressei como aluna do doutorado do Programa de Pós Graduação Família na Sociedade Contemporânea no Programa de Pós-Graduação em Família na Sociedade Contemporânea da Universidade Católica do Salvador (UCSal), buscando aprofundar meu conhecimento num programa interdisciplinar, pois seguia inquieta com as questões do ensino, da prática assistencial, consequentemente das interações das pessoas envolvidas no cuidado à pessoa em situação de hospitalização, notadamente os familiares acompanhantes.

Foi uma experiência exitosa, pois pude dialogar com as diversas áreas do conhecimento das ciências sociais e outras, vivenciando também o estágio doutoral na Universidade de Lisboa, sob orientação das professoras Doutoras Sofia Aboim e Sofia Marinho, também pude ter contato com outras universidades de Portugal, a exemplo da Universidade Aberta de Lisboa e Universidade de Coimbra.

Defendi a tese de doutorado intitulada Família e trabalhador/a de saúde na clínica médica: um estudo etnográfico sobre as interações, sob a orientação da professora Doutora Lívia Alessandra Fialho Costa.

 

SER ENFERMEIRA: O COMEÇO...

 

Tornei-me Enfermeira no início dos anos 90, precisamente dia trinta de março de 1991. Como qualquer formanda, aquela noite deveria ser de festa e grande alegria, e foi, só que por um tempo limitado. Precisava descansar, porque na manhã do dia trinta e um de março de 1991 realizei o meu concurso público para o cargo de enfermeira do Hospital Inácia Pinto dos Santos - Hospital da Mulher. Fui aprovada e no ano seguinte, iniciei as atividades como enfermeira no referido hospital na cidade de Feira de Santana, Bahia. O hospital recém-inaugurado e eu recém-formada.

Tive uma passagem curta e significativa nessa instituição, nesse período atuei em sala de parto, assistindo ao binômio mãe-filho no alojamento conjunto, coordenei e estruturei juntamente com a equipe de auxiliares e técnicas de enfermagem a Central de Material Esterilizado – CME. Participei juntamente com as colegas, da primeira greve do hospital.

Daquela época cultivo boas amizades e poucas irmandades também possuem desgosto pelo modo como eu e algumas colegas fomos desligadas, o qual entendo como injusta, pois o desligamento se deu após o movimento sob alegação de que possuíamos um vínculo por concurso público com a Secretaria de Saúde do Estado da Bahia (SESAB), sem nos consultar em qual dos vínculos desejávamos seguir, pois precisávamos fazer a opção por um dos vínculos.

Em 1992, prestei concurso público para a SESAB, sendo aprovada e convocada para trabalhar no Hospital Geral Clériston Andrade (HGCA), onde atuei durante 18 anos. Nos primeiros anos, na clínica médica, cuidando de pessoas hospitalizadas com doenças crônicas, na clínica cirúrgica, cuidando de pessoas em pré e pós-operatório, na materno-infantil, cuidando de mulheres gestantes e do binômio e na pediatria e nos anos seguintes, trabalhei somente na unidade de emergência e por fim, na sala de estabilização. No HGCA desenvolvi minhas atividades sempre no período noturno, finais de semana e feriados.

Busquei na minha atuação, na medida do possível atentar para a singularidade da pessoa, buscando flexibilizar as interações para o cuidado à pessoa hospitalizada e a seus familiares. Tais experiências contribuíram para aumentar a minha inquietação com relação ao cuidado à família em situação de hospitalização, pois percebia que são necessários investimentos a partir de pesquisas para que os resultados sejam transformados em ações práticas. Considerando que o hospital é uma instituição que cuida de pessoas/famílias que enfrentam o processo de adoecimento, mas que se apresenta como uma estrutura hierarquizada por meio de normas e rotinas, fundada no modelo biomédico, no qual, muitas vezes a pessoa passa a ser reconhecida como um número, uma doença e/ou sinais e sintomas.

 

SER PROFESSORA DO CURSO DE ENFERMAGEM: DA INQUIETAÇÃO À CONCRETIZAÇÃO

 

Desde a graduação, nutri uma inquietação em ser professora do curso de graduação em Enfermagem da UEFS por acreditar que podia/posso contribuir na formação de enfermeiras (os), considerando a (o) discente como protagonista do seu processo de ensino e aprendizagem (ANASTASIOU, 2005). Dito de outro modo, formar enfermeiras (os) críticas (os), reflexivas (os), como preconizado no projeto político pedagógico do curso (Universidade Estadual de Feira de Santana, 2017) e que possa promover à saúde e cuidar daquelas (es) que possuam necessidades básicas afetadas (HORTA, 1979) promovendo o cuidado humano (WALDOW, 1995, 1995,1998, 1998,1999).

A minha primeira experiência com o ensino foi em um curso técnico para auxiliares e técnicos em Enfermagem em Feira de Santana. Logo depois, em 1993, fui selecionada numa seleção pública para professora substituta do curso de graduação em Enfermagem, no componente curricular introdução à enfermagem, do Departamento de Saúde da UEFS, era um contrato de seis meses. Em 1994 prestei outra seleção para o referido componente curricular, dessa vez com vigência de dois anos.

 Em 1995, realizei Concurso Público concorrendo a uma vaga para professora auxiliar do componente curricular introdução à enfermagem, sendo aprovada, em primeiro lugar, passando a compor o quadro de docentes efetivas (os) do Curso de Enfermagem da UEFS.

 

A DINÂMICA DA MINHA ATUAÇÃO DOCENTE

 

 A minha atuação na UEFS tem se dado no Ensino, na Pesquisa e na Extensão, sendo mais intensa no ensino de graduação. Atuei na primeira e na segunda reforma curricular implementadas pelo curso de Enfermagem para atender as Diretrizes Curriculares (Universidade Estadual de Feira de Santana, 1997, 2004). A primeira aconteceu em 1998 e a segunda em 2004 e a partir da última passei a ensinar o componente curricular semiologia e semiotécnica aplicada à enfermagem, no qual sigo atuando.

Tais participações nas reformas aguçaram as minhas inquietações com o saber e o fazer da enfermeira, ainda mais, motivando o encaminhamento de uma proposta para um componente curricular optativo intitulado Cuidado à família em situação de hospitalização cuja ementa é: Concepções de famílias; as famílias como cuidadoras/cuidadas no processo de adoecimento/hospitalização; cuidado espiritual às famílias e estratégias de abordagem às famílias frente às vulnerabilidades emergentes do adoecimento/hospitalização; sistematização do cuidado de enfermagem às famílias que teve a sua aprovação e é ofertado para os cursos de saúde da UEFS. Também leciono o componente curricular Pesquisa em Saúde. Ainda no ensino de graduação atuo na orientação de monografias de conclusão de curso, orientação de monitoria no componente curricular.

Iniciei no ensino de pós-graduação na UEFS - stricto sensu em 2019, como docente no Mestrado Profissional em Enfermagem, inicialmente fui professora colaboradora e coorientadora de uma dissertação e posteriormente me tornei professora permanente e ensino o componente curricular Atenção de Enfermagem à População em Risco e Vulnerabilidade no Processo Saúde Doença, juntamente com três colegas.

Na Pesquisa, fui uma das idealizadora e responsável pela elaboração do projeto de implantação do Núcleo de Estudos e Pesquisas sobre o Cuidar/Cuidado (NUPEC), juntamente com as professoras Eliana Conceição Figueiredo (aposentada); Márcia Sandra dos Santos Fernandes Lima; Mirian Teresa Cerqueira Brito Maciel (aposentada); Aldacy Gonçalves Ribeiro (professora substituta, contrato encerrado) e Maria Geralda Gomes Aguiar (in memoriam). O NUPEC foi criado no ano de 2005 e durante quase 12 anos foi coordenado pela Profa Dra Maria Geralda Gomes Aguiar, tendo-me como vice coordenadora até 2017, quando me tornei coordenadora. O referido Núcleo está vinculado ao Departamento de Saúde e a Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação-PPPG/UEFS e Pró-Reitoria de Extensão- PROEX/UEFS.

Na Extensão, integrei o Programa de Vacinação contra Hepatite B que desenvolve ações educativas e preventivas em saúde, atendendo a professoras (es), estudantes e trabalhadoras (es) da área de saúde da UEFS e o Programa de Doação Voluntária de Sangue que incentiva o “trote solidário” na UEFS. Atualmente, integro a equipe do projeto de extensão Promovendo a saúde no cotidiano das feiras-livres de Feira de Santana, Bahia, ligado ao NUPEC.

 Referente a outras atuações ao longo da minha carreira coordenei o Espaço Didático-Pedagógico do curso de Enfermagem no Hospital Geral Cleriston Andrade-2003-2007; o componente curricular Pesquisa em Saúde (2021.1-2022.1). Atuei em comissões organizadoras de eventos de enfermagem. Ressalto a participação em algumas gestões na diretoria da Associação Brasileira de Enfermagem-Regional Feira de Santana, vinculada a Associação Brasileira de Enfermagem entidade de caráter cultural, científico e político sem fins lucrativos que vem se debruçando sobre os rumos da profissão. Integro a Associação dos Docentes da UEFS (ADUFS).

A minha contribuição para a construção de conhecimento em enfermagem também se dá na qualidade de consultora ad hoc de eventos da enfermagem e de outras áreas avaliando resumos e como consultora ad hoc de Revistas de cunho científico. Participação em bancas de concurso para a formação de quadro docente do curso de enfermagem na UEFS e em outras Instituições de Ensino Superior (IES).

 

SOBRE AS MINHAS INQUIETAÇÕES PARA O FUTURO...

 

Sigo inquieta no meu saber e fazer. Dito isso, para o futuro pretendo experienciar mais possibilidades de ensinagem e aprendizagem no ensino, na pesquisa e na extensão. No ensino, a minha busca é promover o ensino do cuidado no processo de formação, considerando o estudante, a pessoa, a família e a comunidade como um ser político e a partir da interação possa emergir consenso mútuo (HABERMAS, 2012) no que tange ao cuidado. Investir na pesquisa- ensino-pesquisa.

Na extensão, objetivo ampliar a minha participação. Aprofundar a divulgação das pesquisas no NUPEC entre as (os) participantes e a comunidade acadêmica e externa. Realizar ações de educação em saúde com base nos resultados das pesquisas realizadas pelo NUPEC.

Na pesquisa, pretendo finalizar o projeto Práticas de cuidado com feirantes em Feira de Santana, Bahia com a publicação do terceiro livro. Aguardar a tramitação do projeto intitulado Correlação das práticas de cuidado das famílias frente ao processo saúde-doença nas instâncias da Universidade para executá-lo.

 

À GUISA DE CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

No decorrer dos meus trinta anos como docente da UEFS, no curso de graduação em Enfermagem, e recentemente no curso de pós-graduação Mestrado Profissional em Enfermagem, estou contente e agradecida pelas vivências e experiências que colaboram na constituição do meu ser pessoa e profissional. Considero que escolher ser trabalhadora de instituições públicas - hospital e universidade, guarda uma coerência com o que acredito. Atuar como enfermeira num hospital geral e ao mesmo tempo ser professora de enfermagem qualificou o meu saber e fazer, a meu ver, de modo exitoso.

Ser enfermeira e professora tem sido um processo de construção permanente. Ao me tornar enfermeira desejava percorrer os caminhos da assistência e do ensino, o fiz concomitantemente por vinte anos.

 

REFERÊNCIAS

 

A LISTA: [Compositor e intérprete]: Osvaldo Montenegro. Rio de Janeiro: Warner Music Brasil, 2001. Disponível em: https://oswaldo-montenegro.lyrics.com.br/letras/65521/. Acesso em: 20 jun. 2022.

ALVES, Rubem. Entre a ciência e a sapiência: o dilema da educação. São Paulo: Loyola, 2001.

AMORIM, Rita da Cruz. A melhor casa do mundo: minhas memórias de infância. In: RABINOVICH, Elaine Pedreira et al. (Org.). Autoetnografia colaborativa e investigação autobiográfica: a casa, os silêncios e os pertencimentos familiares. Curitiba: Juruá. 2016.

ANASTASIOU, Léa das Graças Camargos; ALVES, Leonir Pessate. Processos de ensinagem na Universidade: pressupostos para as estratégias de trabalho em aula. Joinville: UNIVILLE, 2005.

 

BOLSANELLO, Maria Augusta. Memorial acadêmico de uma professora universitária: sentido e significado. Educar em Revista, Curitiba, n. 64, p. 317-342, abr./jun. 2017.

FONSECA, Claudia. Concepções de família e práticas de intervenção: uma contribuição antropológica. Saúde e Sociedade, São Paulo, v. 14, n. 2, p. 50-59, maio/ago. 2005. https://doi.org/10.1590/S0104-12902005000200006

HABERMAS, Jurgen. Teoria do agir comunicativo: racionalidade da ação e racionalidade social. Trad. Paulo Astor Soethe. São Paulo: Martins Fontes, 2012.

 

HORTA, Wanda Aguiar. Processo de enfermagem. São Paulo: EPU, 1979.

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE FEIRA DE SANTANA. Projeto Político-Pedagógico Curso de Enfermagem. Feira de Santana, 2017.

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE FEIRA DE SANTANA. Colegiado do curso de enfermagem. Currículo pleno do curso de enfermagem.  Feira de Santana, 1997.

UNIVERSIDADE ESTADUAL DE FEIRA DE SANTANA. Colegiado do curso de enfermagem. Currículo pleno do curso de enfermagem.  Feira de Santana, 2004.

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